quarta-feira, 29 de abril de 2015

(pássaro aprisionado)


self_portrait_with_bonito Frida Kahlo
Passo a mão pelo deslumbramento
da cor
e sinto a carícia da penugem.

Ao soltar-se um gorjeio contido
das grades da prisão
enovela-se em mim um arrepio.

De súbito, percebe-se um repelão
incontido
dum tom verde que aflora os olhos,
uma esperança condensada
a intervalos.

Que coração magnânimo
decreta o fim da pena?
pois o céu fica mais céu
com o majestoso voo da liberdade.


hajota




sábado, 25 de abril de 2015

Quem cantará a canção?

imagem recolhida na web



Não há verde nas ruas deste país
nem botas que nos façam a revolução.

Quem cantará a canção?
Todos unidos: eu tu nós eles.

O vermelho vivo do coração
pintará a liberdade do nosso chão!

hajota

terça-feira, 21 de abril de 2015

A força das palavras

Couple-Riding-Black-and-Violet-Wassily-Kandinsky-1906
http://www.dailyartfixx.com/
Primeiro, sem saber, inventei e,
afinal, as palavras já prontas.
Mas eu inventei-as e,
para não as esquecer,
escrevi-as no meu chão
antes de as dizer, e,
ao dizê-las, peregrinei
as mãos nas evidências
escaldantes das vogais,
humedecidas-emudecidas
no vermelho da língua, e
em chegando ao fim,
escritas ditas feitas,
as palavras prontas prenhes
ressuscitaram o que parecia
a morte. 
Sem saber. Acreditei.

               

                                                                                             hajota

terça-feira, 14 de abril de 2015

Carpe diem

Não adianta moer mais a cabeça
em conjugações de tom imperativo
expedições cuidadosas nas ordens
na exploração noturna da harmonia
havendo problemas de hardware

Não adianta consumir erudição
escolástica de latim imagético
em libidinosos e esconsos becos
na procura do par que lhe compete
havendo problemas de hardware

Não adianta zelo de semiótica  
a mensagem não segue até os pés
se  o coração está em fibrilhação
e perros os pés justos e perfeitos
haverá problemas de hardware

Não adianta se as deambulações
perdem regularidade que o par
antes uma luva em bilros de linho
agora se aquieta frio e murcho
haverá problemas de hardware

Deixaram de dançar e até andar
inertes sem préstimo limitados
a excrescências existenciais
pornografia de formações tróficas
O fio que os liga ao coração quebrou

O mal revelou-se tão subtilmente
na roupa - lã peúgas botas pijama -
em progressão livre dentro da cama
roubando espaço ao traçado das curvas
e no entanto frios frios os pés

Não adianta pois esperar milagres
promessas cleópatras e salomés
danças tentações som de sinfonias
a não ser romances epifanias
nas químicas da molécula azul 

hajota


dali_a_persistência da memória



segunda-feira, 6 de abril de 2015

Cura


woman with eyes closed - lucian freud
Tinha cerradas as janelas
sempre como se noite fosse
dizia que o sol tinha dono
nada sobrava para elas

Todas as luzes apagadas
como se fossem pedras cegas
negras luas novas pintadas
no pó d' areia do deserto

Sem telhado fria indefesa
em casa morava alagada
a chuva miudinha teimava
toldar-lhe o resto da beleza

Com a mão direita espalmada
percorri-a de cima a baixo   
com um beijo quente colei-lhe
a conta que estava quebrada

Chocalhou inocência oculta
com o contágio dum sorriso
abriu-se em febre franca e pura
o sol nasceu no som do riso


hajota