Por vezes chega um rumor
um surdo rumor do tempo.
As pontes se desmoronam
as pétalas e as palavras
de repente sem sentido
as árvores onde o vento
deixava um frio assobio.
Por vezes chega um cinzento
um surdo absurdo vazio
Manuel Alegre, Doze Naus, ed. D. Quixote
Amber Marie Stifflemire, Blue Birds |
Na vertigem virtual da luz a vida cega
e a máquina já não obedece ao homem
é a uniformização estúpida
o absurdo que o reduz
Não há algoritmo que perceba o sabor
da maresia o choro sal a dor
nem sequer o brilho escancarado do sorriso
que sela a (in)genuidade dos puros
Contento-me então nos elementares sentidos
no tactear a escorrência da tinta que pinta
montes e vales na fluência da flauta
do rouxinol nos
confins do silvado
no serpentear do rio ora manso ora irado
no incenso denso suave intenso
Na paixão secreta que me acolhe
resgatado venho do pecado original
Curado na sombra dos dias tórridos
confino-me à insignificância gestual
da distância que a mão alcança
esboçando o contorno imponderável
da forma do corpo imperfeito
Espero pelas marés vivas de Agosto
Não não consigo
conter-me fechado
Abro-me atravessado nesta página por arar
por semear e já vejo no verso e no reverso
uma espuma a adejar num sopro de vento
a caneta a água os lagos derredor:
a esfera roda e obedece a mão:
do campo branco em que escrevo
eleva-se uma subtil fragância d’ alma
E assim me basto
hajota
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Nota
Ao voltar, depois dum longo período de abstinência, sem editar qualquer trabalho aqui, não quero deixar de agradecer a todos os amigos as manifestações de simpatia que me fizeram chegar.
Há um tempo do antes e um do depois. A vida muda e muda-nos a cada instante. A mim também. Enquanto nos podemos adaptar, tudo bem. Eu estou bem.
Um abraço, amigos.
Um belo mar arável
ResponderEliminarcom o teu punho
Abraço amigo
Virei para o poema para comentar como merece, este poema de intensa (para mim) "fragrância d’ alma".
ResponderEliminarEntretanto, expresso o meu salutar contentamento pelo "regresso"!
Bjinho, Agostinho
Seja bem regressado.
ResponderEliminarE regressado em grande.
Aquele abraço
Gaja Maria deixou um novo comentário na sua mensagem "A distância que a mão alcança":
ResponderEliminarA vida é mesmo assim e nós vivemos ao sabor dela, em constante mudança. Abraço.
Graça Pires deixou um novo comentário na sua mensagem "A distância que a mão alcança":
ResponderEliminarO Poeta voltou. E trouxe com ele a aparente serenidade de um sobressalto. Reuniu sensações e paisagens. Esvaziou as palavras para de novo as escrever e, ao mesmo tempo, fazer delas imagem, pensamento, silêncio e grito e assim recuperar a inocência que "a página por arar por semear" reclamava.
Um poema muito belo, meu Amigo Agostinho.
Também há tinha saudades de o ler AQUI. Um beijo.
Marta Vinhais deixou um novo comentário na sua mensagem "A distância que a mão alcança":
ResponderEliminarE escreve-se finalmente... Para sentir tudo.... Para além da linha do horizonte...
Bom saber que está bem...
Até já
Beijos e abraços
Marta
Sou uma felizarda e não o sabia.
ResponderEliminarTenho tido o privilégio de ter o Agostinho
a passear pelo meu simples cantinho,
na sua grandiosidade de Poeta que sabe ler
o quase nada das pequenas coisas,
mas isso eu sabia...
Sabia que isso era um privilégio,
mas que seria felicidade
só mais tarde, ou melhor, hoje, agora, o soube.
Não lhe sei dizer de outra forma, Agostinho, o quanto
me orgulho de fazer parte do seu núcleo de admiradores
da sua escrita e do seu imenso saber e sentir.
Um beijinho.
Que bonito!
ResponderEliminarAinda bem que voltou, gosto do seu dizer, Agostinho!
Gosto ainda que se mude a cada instante, que se adapte e que esteja bem...que escreva e se reinvente a cada instante.
Um beijinho amigo
Antes de mais: que bom que está bem!!!
ResponderEliminarQuanto ao poema - belo, belíssimo - "assim se basta" e não é com nada pouco (que se basta)... Contorno intenso de uma vida.
Beijinho.
E voltaste em força, com um excelente poema.
ResponderEliminarParabéns pelo teu talento, ainda que adormecido desde Abril...
Um bom fim de semana, caro Agostinho.
Abraço.
Elevadíssima poesia! Um abraço poético do outro lado do oceano!
ResponderEliminarAbraço, Agostinho,
ResponderEliminargosto de saber que voltaste!
Meu grande mestre, finalmente tua poesia dardeja! Gosto muito de teus textos. Tua poesia ausente, foi como a amada que se vai para que o amante faça morada nela. Belíssimos versos, Agostinho! Parabéns!
ResponderEliminarA vida é o cheio e o vazio!
Ou seja: o vazio e o cheio.
Ondulamos nesse meio
Igual as águas de um rio
Que corre, corta desvio,
Desvia, mas não tem freio
Vai e desagua no meio
De um oceano com frio
Para o calor que ampara
Onde ela morre sem cara
De sua forte corrente.
A vida Augustinho é a tara
Por vida - amor que declara
Amor que há dentro da gente.
Grande abraço. Laerte.
Entrei deparando com um "vazio".
ResponderEliminarMas como um vento enfunando as velas, a maré avisava bonança e derreteu-se com a alegria do regresso.A mansidão das curvas do rio contornam as margens dos dias, e tudo será como quer, queria.
Bem vindo, Agostinho, bom regresso, dias felizes!
Beijo! *
também há um tempo para ter esperança e isso basta-nos
ResponderEliminaro melhor para si, Agostinho
Agostinho,
ResponderEliminarGostei muito deste seu poema. Notei a sua ausência mas como também ando ausente, compreendo o seu estado. Por vezes é necessário.
O que interessa é estar bem.
Voltou com a beleza habitual. Obrigada.
Beijinho.:))
hajota
ResponderEliminare na ausência se fez poema
completo
com esperança e uma mescla de vontade
pois assim é o seu terminus com chave de ouro
cito
"e assim me basto"
um belo momento de poesia
beijinhos
:)
Um belíssimo trabalho, Agostinho, do qual, irei ficar com umas palavrinhas debaixo de olho... para qualquer dia destacar lá no meu canto... com um link para aqui, pois claro... se me der licença...
ResponderEliminarA maquina do tempo... não nos deixou livro de instruções... para sabermos apreciar devidamente... não, a nossa meta ou destino... mas a viagem...
Muito bom tê-lo de volta, por aqui, e sabê-lo de boa saúde, Agostinho!
Desta feita, sou eu que tenho andado um pouco mais ausente, nas últimas semanas... enquanto a minha mãe recupera, das consequências de uma escorregadela, que lhe magoou um pouco, uma perna, já de si problemática... e tem requerido acompanhamento médico constante... Felizmente a fase mais dolorosa, já parece ter passado... e mais umas semaninhas de cicatrização sempre assistida, para a coisa não complicar... e parece-me que não terá maiores consequências. Devido aos medicamentos para o sangue e coração... a toma de medicação adicional... tem de ser sempre muito vigiada...
Beijinho! Feliz domingo!
Ana
Bom dia, quando a ponte desmorona é necessário deixar a tempestade com ventos fortes passar, porque o mundo não vai acabar, calmamente vai-se reparando a ponte com uma estrutura mais forte, afinal a vida tem tanto para preencher com novas descobertas o poema é fantástico.
ResponderEliminarBoa semana,
AG
1º: Manuel Alegre exprime muito bem aquela sensação de falta, de impotência e até de inutilidade que nos violenta, por vezes por um coletivo, muitas (o que é bem pior) por nós próprios.
ResponderEliminar2º: o poeta (Agostinho), apesar do visível desalento expresso no poema, não se extingue com a falta de luz, antes a atiça no que lhe é dado ver, sentir e tocar. Não se resigna e coloca nas palavras a sua alma.
Salvífica é a escrita quando a alma sofre.
Sublime poema, Agostinho!
Deixo, ainda, uma palavra de apreço pela generosidade que manifestas nos meus singelos escritos.
Bjinho e tudo de bom!
Também passei um tempo fora da blogosfera. Senti falta de tudo e de todos, voltei!... AbeaçO
ResponderEliminarCaro Agostinho,
ResponderEliminarA fragrância da alma no rio das palavras, a encantar
da sua poética sempre bela, numa humanidade
em que nos reconhecemos:
"Eleva-se uma subtil fragrância d'alma
E assim me basto"
Aprecio muito a sua volta, Poeta.
Aqui é um espaço especial, o mundo é grande
com almas poéticas grandes no sentir
humano assim!...
Bj.
Ps: Sempre grata pelos seus comentários valorosos assertivos!
Sobre o seu comentário, concordo com a sua definição
perfeita: "Uma múmia vinda do mundo dos mortos"!...
Quem sabe, caro poeta, este poder macabro da múmia,
junto e o principal, sistema epidêmico da corrupção,
destruindo, aniquilando e envergonhando uma nação
honesta (não sendo da classe política...) que
custa a ver algum horizonte (perdido!)...
Caro Agostinho sempre haverá momentos
ResponderEliminarpara escrevermos poemas e também para
ler poemas de tantos poetas.
Um abraço.
Pedro
O mais importante é estar bem, fico contente por isso.
ResponderEliminarDo texto - muito sentido, diga-se de passagem - intuí que algo menos bom aconteceu na sua vida : desejo que se não repita.
Abraço com estima, Agostinho.
Composição escrita com muito talento, a fragância dos seus versos é embriagante.
ResponderEliminarNoite de Paz.
Abraço!
Passando para deixar um beijinho, e votos de um excelente fim de semana...
ResponderEliminarAna
E que seja um ótimo regresso. Sim, a pausa é necessária, faz parte da vida. Eu tenho feito. Nos últimos anos, o cenário tem mudado com certa velocidade, parece coisa dos novos tempos.
ResponderEliminarAgradeço pelos teus votos no meu blog, por conta do meu aniversário. Desejo a você amigo, felicidades e saúde.
Beijinhos e abraço do Brasil.
Passo mas não deixo mensagem. Estranhei o vazio. Ainda bem que voltou. Muda-se tudo até as vontades dizia Camões mas não se muda o amor à beleza e à poesia...
ResponderEliminarQue inspiração, no regresso!
ResponderEliminarEste também é dos tais...
Abraço, Poeta!