sábado, 26 de janeiro de 2019

Espaços e ficções



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Não me exijam
que diga
o que não digo

M.ª Teresa Horta, Estranhezas, 
 início de Questões de Princípio 


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busca pólos 
busco 
ainda o tom  
contacto pólo
tacteio
apresso a luz
curto circuito

hajota

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Akvarell 1982, Navle Skodar i halvlit
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Aqui neste ancoradouro sentado
lugar de ver sem muro
tudo o que está e o que não está:
passado presente e futuro

Cadeiras mesas copos chávenas
e o éter de etílicos cheiros saturado
e perfume suado do convívio íntimo
animal o velho e o lavado

e nuvens de fumo espiralado
das chaminés da cavernosa alveolar
adensando tenebroso o cinza do céu
à espera da redenção duma corrente de ar

E vejo fantasmas pessoas
sem que o saibam já ausentes
e a ficção dos maduros pausada
de sorrisos contidos à mesa rentes

e os conformados de etiqueta comum
e os cínicos na contrafacção do riso
de brilho sacana pregando ladaínhas
de descaramento escarninho

e jogadores de moedinha jocosos
ao pôr do sol de ambições incríveis
a afogarem-se verdes os invejosos
em queda  nos abismos do desespero

Vejo enfim  as puras da alegria
descuidada ainda ingénuas figuras
do devir que sobem à tona sem suspeita
de irem repetir guiões iguais amanhã


hajota

23 comentários:

  1. Vê o Mundo nas suas glórias, nas suas traições, nas tristezas e nas alegrias...
    A vida num momento...
    Lindo...
    Beijos e abraços
    Marta

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  2. Boa tarde!
    Gostei da postagem Obrigada!;)

    Beijo. Bom fim de semana!

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  3. Simplesmente desconcertante.
    Aquele abraço, boa semana

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  4. Um ancoradouro pode debruçar-nos para o tempo que vai fazendo e refazendo o enredo dos dias. Dele podemos olhar a vida e encontrar o nosso espanto com o que vemos ou imaginamos ver. Mesmo sabendo que aquilo que é eterno só se vê de muito, muito longe.
    Uma boa semana, meu Amigo Agostinho.
    Um beijo.

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  5. Um olhar talvez pessimista, mas lúcido. Se é que os adjectivos são compatíveis...
    Mas, ai de nós se não encontrarmos outros olhares... Às vezes basta soprar um pouco a nuvem...
    Menos mal que estás no ancoradouro, Poeta!

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  6. Esses momentos valem ouro, sem barreiras podemos refletir a vida como realmente é, sem máscaras, sem maquiagem. Mas assim seguirá a humanidade, aos tropeços, aos espantos ou esperando o momento de acertar os passos, quem sabe!?
    Do passado cabe tirarmos as lições, do presente, o aprendizado, do futuro... a maturidade e recompensa.
    Gostei muito, Agostinho.
    Uma ótima semana pra você.
    Beijo.

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  7. não precisas trepar altas falésias,
    basta-te um ancoradouro, ou outro qualquer "lugar de ver",
    para, pelo teu olhar arguto, desfilarem, num relance, todos os tiques e mazelas
    desta "Comédia Humana"...

    felicito-te, meu caro Agostinho
    pelo teu talento e pela tua lucidez.

    grande abraço

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  8. Querido amigo Agostinho
    Brilhante!
    Mas… um soco no estômago, esta análise tão lúcida, fria, sem “retoques” ou Photoshop.
    Porque poder ver sem muro é posição privilegiada. O que daí se vê… pode ser deplorável, intrigante ou mesmo frustrante.
    “pessoas sem que o saibam já ausentes” – triste!
    “ingénuas figuras do devir… repetir guiões iguais amanhã” – realidade chocante!
    A humanidade em todo o seu esplendor!!!
    Classificação: Ainda melhor do que o habitual.
    Deixo a minha admiração ao Poeta.

    Desejo bom Fim-de-semana
    Beijinhos
    MARIAZITA / A CASA DA MARIQUINHAS

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  9. Excelente poema de tanta lucidez!

    Beijinho, bom resto de semana

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  10. Ver sem muro pela frente é ver muito mais ao longe...
    Excelente poema, os meus aplausos caro Poeta.
    Agostinho, um bom fim de semana.
    Abraço.

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  11. OI AGOSTINHO!
    UM OLHAR SERENO E CRÍTICO SOBRE UMA HUMANIDADE REPLETA DE FIGURAS QUE JÁ SÃO FANTASMAS E NEM O SABEM.
    ESPETACULAR, AMIGO.
    ABRÇS
    https://zilanicelia.blogspot.com/

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  12. Olhando o mundo... que se reflecte dentro de nós... ora denso, ora tenebroso... ora fascinante... com tudo o que o que pode oferecer-nos de maravilhoso... melhor saboreá-lo com calma... sentado a uma mesa... com uma boa panorâmica... e com a nossa melhor das companhias por perto... a nossa consciência...
    Um verdadeiro tratado de lucidez, este poema, Agostinho!... Parabéns!...
    Beijinho! Desejando-lhe uma feliz semana!...
    Ana

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  13. Janita deixou um novo comentário na sua mensagem "Espaços e ficções":

    Gostei muito desta forma de observar o mundo, por dentro e por fora de muros.
    Os puros de coração e dos impuros e ainda vejo laivos de narcisismo.
    Naqueles que, mesmo dentro de um curto espaço, se dobram todos para olhar o próprio umbigo.
    Há tanto disso, tanto!

    Beijinhos, Grande Poeta Agostinho!

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  14. Gosto muito dessa forma de ver e definir o mundo viver. É tipo refletir interior para depois sair ultrapassando fronteiras. AbraçO

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  15. O mundo que habitamos com os antagonismos e protagonismos em constante rodopio com a febre que os move.
    Que brilhante poema, Agostinho!
    Beijinho

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  16. Vejo-te na faixa do cais
    Olhando o vazio do porto,
    Serenamente absorto
    Nos teus sonhos virginais.

    Pena que somos mortais...
    Porém ninguém está morto.
    Busquemos vida e conforto
    Nem de menos, nem de mais!

    E assim vendo o cais sem muro,
    Singremos para o futuro
    Nas asas da poesia

    Com um vento em quadrante puro!
    Augustinho, estou seguro
    Que a alma não se esvazia...

    Bravo! Magnífico o teu poema, amigo! Luz! Muita luz e saúde! Grande abraço. Laerte.

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  17. O mundo com seu quotidiano
    todo do avesso
    um mundo em que vivemos...

    muito reflexivo...

    beijinhos

    :)

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  18. Gostei da sua ótima ironia nesta crítica de costumes,
    nestas cidades onde a maioria só olha o umbigo.
    Qualquer fase má que tenha passado não afetou o estro.
    Os meus parabéns.
    Venha passear no meu Vivenciar, tenho poesia e amor.
    O meu terno abraço.
    ~~~~~~~~~~~~~~

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  19. Fenomenais poesias, abraços.

    https://ives-minhasideias.blogspot.com/

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  20. Aproveitando que passei por aqui... e depois de reler este notável momento poético, deixo um beijinho, bem como os meus votos de um feliz domingo, e uma excelente semana!
    Ana

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  21. Suas palavras me fizeram lembrar dos meus passeios
    no fim da tarde na Costa da Caparica, depois de um
    dia vencido em Amora.

    Sentir o mar... Ouvir as ondas...
    Decifrar o que foi,que está, as cores
    que desfilam num movimento alheio ao tempo.

    Sim, sua poesia me fez recordar com saudades
    um certo tempo poético da minha vida.

    Você tem o dom nato da poesia em suas veias.

    Agradeço por ter lido.

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  22. Aproveitei para reler porque... VALE A PENA!

    RE: Diz um velho ditado popular que "os últimos serão os primeiros". Quanto à louça lavada e etc. não me parece, ainda vejo por lá uns restitos bem apetitosos 😉

    Estou muito grata pela presença na festa de Aniversário do meu “pimpolho”. Ele gostou muito de te ver lá… 😘
    Obrigada!

    Bom final de Domingo e boa semana.
    Beijinhos
    MARIAZITA / A CASA DA MARIQUINHAS

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  23. Pontuação legítima nessa bela publicação.

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