domingo, 8 de junho de 2014

Lancei uma tábua

Salvador Dali

Lancei uma tábua à torrente
de palavras ásperas
que rasgaram paredes,
subitamente,
para que se salvasse a memória
- a seara repleta de espigas
a doirar o sol
no mar sereno dos teus olhos.

Como inutilidade apendicular
a tábua desceu sozinha 
até à finitude árida da praia 
vazia e fria - sem explicação plausível
viraste as costas ao rio.
As espigas de sol de ontem
já não moram nos teus olhos,
a obstinação roubou-nos
a esperança de dias felizes.

hajota

sexta-feira, 6 de junho de 2014

ISAL....



Instituto Superior para a Apropriação e Ladroagem,
imagem Wikipédia
coisa lustrosa de fachada,
convém muito à imagem.
Confere licenciaturas e outros graus
para se embarcar noutras naus,
com o aval do supremo poder,
a escola que nos faltava
para o país de sucesso.

Se o povo ganhar competências
nas artes da subtração
será a nossa salvação.

Há garantia de qualidade
no ensino da alta ciência,
na escola da nobre cidade.
Um vasto corpo docente
com grande conhecimento
de prática farta, experiente,
quer incutir a arte ao povo,
sempre a bem da nação.

Se o povo ganhar competências
nas artes da subtração
será a nossa salvação.

Está fora de moda ser trabalhador,
antes audaz e empreendedor.
- De Lisboa saiam as naus,
na demanda do graal -
ordena o rei com ardor.
O povo todo a surripiar
por terras de abastança
são proveitos a ganhar.

Se o povo ganhar competências
nas artes da subtração
será a nossa salvação.



hajota

Borboletas



http://qriaideias.blogspot.pt/



























Andam por aí agora
soltas da invernal aurélia 
numa pressa clorofílica
em voos de errática folia

De flor em flor inebriadas
pelos primaveris odores
são efémeras aparições de cores
graciosidades no fito da visibilidade.

Nestes dias luminosos 
pigmentos terebentinosos 
pintam a estação  
como fogo no céu de S. João.

Agora nas bordas da vida os olhos
medem as estéticas figuras
que borbulham apetites
nas montras da vaidade.



hajota

quarta-feira, 4 de junho de 2014

A morte sem mestre - Herberto Hélder

http://www.storm-magazine.com
http://diariodigital.sapo.pt/

Li na imprensa que irá ser editado segunda-feira mais um livro de poemas de Herberto Hélder, agora pela Porto Editora. Se acontecer como no último, Servidões, que teve uma única edição e desapareceu num esfregar de olhos, convém estar atento para apanhar um exemplar.




Transcrevo de Servidões o poema seguinte


colinas amarelas, árvores vermelhas,
crua água pelas pedras frias fora e transparente abaixo delas,
e o jubilo imediato de ver apenas isso,
e isso por si só estar tão certo,
e nem um instante me ocorrer que a força destas coisas é
                        [um instante apenas da força da sua morte,
e que essas mortes uma a uma são a minha própria morte
somada erradamente




terça-feira, 3 de junho de 2014

Desencantos noturnos

http://umjeitomanso.blogspot.pt/

 

Escorro a cal das palavras

tão docemente deitadas

na cama dura do poema

onde está a raiz da pena.


Olho a gaivota a romper

o turbilhão de espuma

já na fímbria do alento. 


Quem sabe dos barcos

a subir na maré

aos olhos da madrugada?


Um sussurro pode ser

inconciliável ruído

a rasgar desprevenidos

na inocência da noite.




hajota

segunda-feira, 2 de junho de 2014

O desajustado


Pelas estradas do império

caminha em custosa missão

o seu sangue óbolo à legião

alimenta de Roma o desvario
 
sandálias rotas são soldada

o prémio da morte não tarda.



hajota

Pedra de palavras

imagem da Web




As palavras dizem coisas
e as coisas são palavras
vê tu que a vida que lavras
será uma pedra de palavras.

hajota