segunda-feira, 8 de junho de 2015

Proposições (in)viáveis

"Aproxima-te, não regresses à treva, 
os pêssegos já estão maduros, 
podemos apanhar uma abada e
escondermo-nos no celeiro 
a comê-los, 
ou ao fundo do pátio 
sobre a palha." 

- Eugénio de Andrade, Vertentes do Olhar, Melusina
- 2.ª ed Nov1987, pag 63 - Editora Limiar



Edvard Munch_kiss by the window

Como hão-de os poetas
deambular nas veredas da noite
se cerrados em altos muros?
Como hão-de fornecer-se de folhas
para a escrita eterna
se nem uma árvore de jeito têm?

O disparate dos ciprestes! 
guardiões esquálidos perfilados
em apneia permanente e subtil imobilidade
a compasso plantados  
numa intimidade que conspurca
a alvura dos muros caiados

De esplendorosas folhas
plátanos é que ficavam bem
Sem penugem na primavera
não vá algum poeta de lírica feição
na penumbra da noite espirrar
desencadear tempestade infernal

os estorninhos  todos a desarvorar
eles que nem dão para grelhar
Toda a gente já viu o desatino
que os bandos podem causar
O Saramago viu-se grego
na Jangada para os aquietar

Um desígnio nobre de campanha:
plátanos para poiso de poetas:
os vivos às horas de calor e à noite
distribuídos pelos galhos mais altos
os passados à horizontal posição
os da outra dimensão

Parece-me uma boa proposição
já para a próxima eleição
Além do mais um plátano
é um calendário no estado puro:
anuncia as estações pelas cores
Melhor que o dos pneus michelin


hajota

23 comentários:

  1. Gosto do seu humor e eu também escolheria os plátanos com poetas distribuídos pelos galhos.:)

    Boa semana.

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  2. Belíssimo poema!Parabéns .Abraço.

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  3. Poeta,
    gosto de versos seta
    de árvores
    de estorninhos
    e rimas, mas

    há um engano teu
    maior que o meu

    nem "Toda a gente já viu o desatino
    que os bandos podem causar"

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  4. Fina ironia em verso.
    Aquele abraço, boa semana

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  5. Que poema, amigo Agostinho, com humor, verdade e ironia misturados naquilo que podia ser um excelente "programa eleitoral" pois pelo menos lembrava-se dos poetas...
    Eu gosto de plátanos. Tenho um poema que começa assim: Voltaremos a um jardim de plátanos com o luar engatilhado nos olhos...
    Um beijo.

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  6. Como bem diz o Eugênio de Andrade, que não se regresse às trevas....Ás vezes, temos essa sensação...Que estamos mergulhados nas trevas...
    Um poema brilhante....
    Beijos e abraços
    Marta

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  7. Plátanos? porque sim

    mas agora delicio-me nas buganvílias

    Abraço

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  8. Muito interessante.
    Gosto de ciprestes, são esguios e erguidos contra o céu. Parabéns.
    Boa noite. :))

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  9. Um poema pertinente e surpreendente.

    Bastante viável.

    Beijinhos

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  10. Passeei tanto à sombra dos plátanos!

    Lindo, Agostinho!

    Beijos. :)

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  11. Gosto de plátanos mas agora é época de jacarandás...
    Bjs

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  12. Boa tarde, lindo poema que absorve atenção, será que vivemos permanentemente nas trevas?
    AG

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  13. Proposição=oração, gramaticalmente falando?
    Há poetas que escrevem em qualquer lugar, em qualquer coisa e sobre qualquer assunto. É o caso.
    Erudito e "sarcástico" poema, que espera um plátano diferente, talvez um salvador com um bocadinho de cor, assim cor de café com leite. Eu prefiro os plátanos altos, magros, claros e de "olhos" verdes.
    Beijo.

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  14. Bom dia
    Não venho julgar o seu poema, nem a sua forma pessoal de os fazer.
    Só sei dizer-lhe que gostei e que também assim eu gostaria de escrever.
    Bonitos os pensamentos desenhados em forma de palavras amadurecidas
    Belas as sombras das árvores que pela idade ficaram engrandecidas.

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  15. só um poeta para desinquietar os pneus Michelin


    um abraço

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  16. Muita originalidade! Porque não uma certa excentricidade...
    E erudição, pois!

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  17. ~ Tal como a Ana, gosto de ciprestes. altivos, elegantes e místicos tornam
    belíssimas as paisagens da Toscana.

    ~ Porém,
    o hino ao plátano está impecável, com um interessante sentido de humor...

    ~~~~~~~~ Abraço amigo, desejando dias felizes e inspirados. ~~~~~~~~
    ~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

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  18. Poesia séria com um toque de nonsense?... Mas fica bem!
    (Entretanto, adoro plátanos...)

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  19. Bom dia, votos para que tenha uma excelente semana.
    AG

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  20. os poetas vivem em completo desassossego, por isso, eles conseguem voar mesmo nas veredas da noite e mesmo prisioneiros em muros, soltarão sempre os seus gritos transformados em palavras.
    realidade, ironia e um humor q.b. baste neste seu poema.
    gostei como sempre!
    beijo
    :)
    PS: já tinha comentado este poema, não sei porque não ficou o comentário....:(

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    1. De facto tenho ideia de ter lido o comentário que refere. Fui ver ao lixo não o encontrei. O que aconteceu não sei. As minhas desculpas.

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